satisfação.
Julgo um dia como bom quando a soma final é >5 na escala de felicidade e satisfação. De 0 a 10, sendo 0 uma tristeza profunda e 10 a plena felicidade.
Hoje eu tive a satisfação de ver dois pacientes que eu tenho acompanhado na enfermaria de cirurgia geral, os quais evoluíram de uma forma incrivelmente boa.
Comecei acompanhando Josefa há mais ou menos 3 semanas, quando a encontrei sedada, em ventilação mecânica, dependente de drogas vasoativas e com uma febre de origem indeterminada - ou seja, pelo menos na minha cabeça, ela tinha vários indicativos de mau prognóstico. Lembrei-me de outra paciente que acompanhei esse ano, que evoluiu dessa forma e que acabou falecendo, após iniciados os cuidados paliativos. Alguns médicos falaram sobre cuidados paliativos para Josefa, mas nada foi levado adiante. É bem provável que ela tenha um hepatocarcinoma, o que não confere um bom diagnóstico, mas acho que qualquer tempo de vida, desde que com qualidade, seja algo pelo que valha a pena lutar. Após ATBterapia, drenos de tórax, sondas, dietas, noradrenalina, furosemida, sedação, delirium, ausência de contactuação com o meio, risperidona, metadona (usada pra desmame da sedação com fentanil)... hoje encontrei, pela primeira vez, Josefa sentada no leito, acompanhada pelo filho, ainda com traqueostomia e 1L/min de O2 na macronebulização, de olhos abertos, conversando com o filho e SORRINDO. Aquilo acabou comigo. Me deu um sorriso quando me apresentei. Me respondeu se tinha dor ou não, e sorriu novamente quando eu contei que estava muito satisfeita com a evolução dela. Me disse "obrigada" com os lábios e com o sorriso, sem sair som nenhum - por causa da traqueostomia. Me despedi e ela me insinuou um "Vai com Deus", sorrindo. Sorrindo sem dente nenhum na boca, mas com a cara reluzindo de esperança e de vida.
Eu aprendi hoje um pouco sobre lutar pelas pessoas e acreditar nos milagres divinos.
O outro paciente é o Alessandro. Lembro de quando ele chegou durante uma passagem de plantão tumultuada, de vaga zero, encaminhado da UAI, onde já estava há 1 dia após um acidente automobilístico, abdome rígido como tábua. Um trauma abdominal fechado. No bloco cirúrgico, encontraram um trauma duodenal com acometimento de mais de 80% da circunferência do órgão, tendo sido feito rafia do duodeno, gastroenteroanastomose e cerclagem do piloro, e colocado um dreno de tórax. Por ter permanecido 1 dia sem cuidados adequados, com um rompimento do intestino, já nos preparávamos para possíveis e prováveis complicações, como lesão pancreática, sangramento, deiscência... Talvez pela idade de 40 anos, mas muito mais provável que tenha sido pelas orações da família, Alessandro evoluiu sem nenhuma complicação. Permaneceu alguns dias em dieta enteral, ansioso por sentir o gostinho de comida novamente. Quando começou com dieta VO, passou pela sala de prescrição dizendo "Ó, tô aqui andando! E já até papei hoje", passando a mão na barriga em movimentos circulares. Como que gestos tão pequenos podem deixar a gente tão satisfeito? Manteve se sentindo bem e com uma ótima recuperação, com uma "boca nervosa" de tanto comer quando foi liberado. Hoje, a residente me disse que ele ia embora de alta hospitalar. Ao checar o leito, ele havia saído, provavelmente pra deambular. Quando o encontrei no quarto, brinquei "Uai, vim aqui e você tinha ido embora!", e ele "Não, tava só andando por aí"; aí respondi com "Ah, mas agora cê vai embora". A esposa e ele literalmente se espantaram de alegria com a surpresa, claramente muito felizes com o retorno pra casa. Perguntaram várias vezes se era isso mesmo, se podia mesmo pedir pra buscarem suas roupas, essas coisas. Outra evolução maravilhosa e um sentimento de satisfação.
É bom saber que estou no caminho certo - certo porque eu consigo ser parte ativa na felicidade das pessoas e minha alegria advém disso.
* Nomes trocados para manter o sigilo dos pacientes.
Hoje eu tive a satisfação de ver dois pacientes que eu tenho acompanhado na enfermaria de cirurgia geral, os quais evoluíram de uma forma incrivelmente boa.
Comecei acompanhando Josefa há mais ou menos 3 semanas, quando a encontrei sedada, em ventilação mecânica, dependente de drogas vasoativas e com uma febre de origem indeterminada - ou seja, pelo menos na minha cabeça, ela tinha vários indicativos de mau prognóstico. Lembrei-me de outra paciente que acompanhei esse ano, que evoluiu dessa forma e que acabou falecendo, após iniciados os cuidados paliativos. Alguns médicos falaram sobre cuidados paliativos para Josefa, mas nada foi levado adiante. É bem provável que ela tenha um hepatocarcinoma, o que não confere um bom diagnóstico, mas acho que qualquer tempo de vida, desde que com qualidade, seja algo pelo que valha a pena lutar. Após ATBterapia, drenos de tórax, sondas, dietas, noradrenalina, furosemida, sedação, delirium, ausência de contactuação com o meio, risperidona, metadona (usada pra desmame da sedação com fentanil)... hoje encontrei, pela primeira vez, Josefa sentada no leito, acompanhada pelo filho, ainda com traqueostomia e 1L/min de O2 na macronebulização, de olhos abertos, conversando com o filho e SORRINDO. Aquilo acabou comigo. Me deu um sorriso quando me apresentei. Me respondeu se tinha dor ou não, e sorriu novamente quando eu contei que estava muito satisfeita com a evolução dela. Me disse "obrigada" com os lábios e com o sorriso, sem sair som nenhum - por causa da traqueostomia. Me despedi e ela me insinuou um "Vai com Deus", sorrindo. Sorrindo sem dente nenhum na boca, mas com a cara reluzindo de esperança e de vida.
Eu aprendi hoje um pouco sobre lutar pelas pessoas e acreditar nos milagres divinos.
O outro paciente é o Alessandro. Lembro de quando ele chegou durante uma passagem de plantão tumultuada, de vaga zero, encaminhado da UAI, onde já estava há 1 dia após um acidente automobilístico, abdome rígido como tábua. Um trauma abdominal fechado. No bloco cirúrgico, encontraram um trauma duodenal com acometimento de mais de 80% da circunferência do órgão, tendo sido feito rafia do duodeno, gastroenteroanastomose e cerclagem do piloro, e colocado um dreno de tórax. Por ter permanecido 1 dia sem cuidados adequados, com um rompimento do intestino, já nos preparávamos para possíveis e prováveis complicações, como lesão pancreática, sangramento, deiscência... Talvez pela idade de 40 anos, mas muito mais provável que tenha sido pelas orações da família, Alessandro evoluiu sem nenhuma complicação. Permaneceu alguns dias em dieta enteral, ansioso por sentir o gostinho de comida novamente. Quando começou com dieta VO, passou pela sala de prescrição dizendo "Ó, tô aqui andando! E já até papei hoje", passando a mão na barriga em movimentos circulares. Como que gestos tão pequenos podem deixar a gente tão satisfeito? Manteve se sentindo bem e com uma ótima recuperação, com uma "boca nervosa" de tanto comer quando foi liberado. Hoje, a residente me disse que ele ia embora de alta hospitalar. Ao checar o leito, ele havia saído, provavelmente pra deambular. Quando o encontrei no quarto, brinquei "Uai, vim aqui e você tinha ido embora!", e ele "Não, tava só andando por aí"; aí respondi com "Ah, mas agora cê vai embora". A esposa e ele literalmente se espantaram de alegria com a surpresa, claramente muito felizes com o retorno pra casa. Perguntaram várias vezes se era isso mesmo, se podia mesmo pedir pra buscarem suas roupas, essas coisas. Outra evolução maravilhosa e um sentimento de satisfação.
É bom saber que estou no caminho certo - certo porque eu consigo ser parte ativa na felicidade das pessoas e minha alegria advém disso.
* Nomes trocados para manter o sigilo dos pacientes.
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