devaneios
Dentre os privilégios de acessar a intimidade de outrem, como faz o profissional médico, é conhecer um pouco mais de como existe e como vive o ser humano, o ser homem, o ser gente.
A doença passa a existir quando seus sinais são percebidos: seja por um incômodo ao tentar dormir, um pensamento inquieto ao sair pra trabalhar, um desconforto no estômago quando se senta pra almoçar, seja com uma perda de peso ou um comentário alheio em relação à aparência de cansaço. A doença existe para o paciente dentro da narrativa de alguém, seja ele próprio ou um observador externo - seja este conhecido ou não.
Não é incomum receber pessoas acompanhadas de seus conjuges, sendo estes os primeiros a perceberem que algo não ia bem. A pergunta propiciatória por vezes tem sua resposta com achados como "minha esposa percebeu que eu comecei a inundar a cama de suor à noite" ou "minha avó sempre me oferecia comida, aí quando eu passei a recusar, ela percebeu que eu não estava bem".
A narrativa da pessoa - ou das pessoas - traz vida e concretiza o campo de ação da doença. A doença que age não apenas no estômago de certa pessoa, mas também nos hábitos alimentares da família dela, na autoestima culinária de quem sempre cozinha naquela casa, na disposição ao laboro que se perde logo após as refeições, no cão que passa a comer mais sobras por intolerância ao alimento da pessoa doente...
Se você consegue parar pra perceber, gente é pura poesia. Na saúde e na doença. Na riqueza e na pobreza.
Na vida a dois ou na vida avulsa.
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